Zuenir Ventura escreveu belíssimo livro com esse título, mas com o ano correto: 1968. Um ano marcante, sem dúvida, e decisivo para fazer do século XX tudo que ele foi. Sobre ele, tudo que se escrever ainda será pouco. Então, nem vou tentar, mesmo porque estou me apropriando desse título por obra e desgraça de um outro ano, mesmo assim somente no plano esportivo. Menos ainda, somente no mundo do futebol.
Para os brasileiros amantes do futebol, 2005 foi um ano marcado por duas siglas: MSI e STJD, e um nome: Edilson. Curiosamente, todos desaguaram na mesma vala comum da ilegalidade, por motivos diferentes. A história MSI/Corinthians já é muito conhecida em seus aspectos aparentes e agora começa a ser melhor conhecida em seus subterrâneos.
Comecemos pela MSI: desde sua chegada ao Brasil essa empresa foi cercada por mistérios e acusações. Seus sócios eram misteriosos, mas dizia-se que um deles era um russo bilionário (em dólares). Falava-se que tantos dólares investidos em futebol num país periférico só poderiam ter como meta a lavagem de dinheiro. Vemos, agora de forma oficial, que boa parte das acusações eram verdadeiras.
Edílson Pereira de Carvalho, juiz FIFA, participou de esquema de fraude em jogos de futebol, destinados a alavancar ganhos de apostadores nos resultados das partidas. Durante 6 meses, o Ministério Público paulista monitorou conversas telefônicas dos envolvidos comprovando as acusações. No decorrer de quase cinco mil horas de gravações, nada apareceu que ligasse um clube, em especial o Corinthians/MSI, a tentativas de manipulações de resultados, que ficaram restritas às ações de apostadores e seus cúmplices na arbitragem.
STJD... Esse órgão, pressionado pela opinião pública exigente de justiça imediata, tomou uma decisão teratológica em termos jurídicos, basicamente por inspiração e ação direta de seu presidente, Luiz Zveiter: anulou 11 jogos do Campeonato sob suspeita de terem seus resultados influenciados pela ação de Edílson P. de Carvalho. Não havia provas ou evidências que amparassem tal decisão, que era apenas uma, e a mais radical, das decisões possíveis. Era, também, a menos perfeita juridicamente. Ou, na verdade, totalmente imperfeita, uma teratologia jurídica, no entender de muitos especialistas da área. Ainda no final daquele ano, depois de todo o imbróglio, descobriu-se que Luiz Zveiter atuava no STJD de forma ilegal, pois, desembargador da justiça federal no Rio de Janeiro, estava impedido, por lei, de atuar em órgão como o STJD.
A cereja desse bolo amargo e ao mesmo tempo carregado de sal e pimenta, foi um lance grotesco protagonizado pelo então goleiro corintiano, hoje no Santos, Fábio Costa, que cortou de forma violenta, imprudente e até desnecessária, uma penetração do meia Tinga no jogo contra o Internacional. Essa ação, claramente faltosa e, portanto, penalidade máxima, não foi assinalada por um velho conhecido dos gramados, o Sr. Marcio Resende de Freitas, coincidentemente finalizando sua carreira de apitador naquele ano.
Ufa! Que ano sinistro.
Esses fantasmas de 2005 tomam conta desse 2007. Teimoso, 2005 não quer terminar e descansar em paz. Ou não deixam que isso aconteça.
Ainda no decorrer daquele fatídico ano, o Ministério Público paulista já tinha investigado e chegado à conclusão que a atuação da MSI no Brasil era fraudulenta e passível, no mínimo, de novas e mais aprofundadas investigações. Curiosamente, a ação do MP de São Paulo foi abortada e o assunto ficou em banho-maria em outros órgãos e esferas. Importantes autoridades “republicanas” foram acionadas visando a presença e atuação no Brasil do bilionário Boris Berezovski, tido e havido como o homem dos dólares por trás da fachada do anglo-iraniano Kia Joorabchian.
Acontecimentos outros, como o misterioso assassinato de um ex-espião soviético em Londres, elemento ligado a Berezovski e em linha de choque com o presidente russo Vladmir Putin, levaram a pouco operante ABIN a sugerir à Presidência da República que a presença do Sr. Berezovski no Brasil seria mais uma dor de cabeça que uma solução. (Aproveito para esclarecer que esse parágrafo é fruto de minhas próprias deduções. Mas não o considero fantasioso, pelo contrário. Isso é o que provavelmente ocorreu.)
Chegamos, dessa forma, ao momento atual, com a Polícia Federal trazendo a público a velha investigação, agora acrescida por novas conversas telefônicas. Aliás, como esse povo fala ao telefone! As falcatruas financeiras envolvendo todos os nomes ligados à MSI e ao Corinthians, inclusive jogadores (alguns, talvez não todos), estão claras e provadas em sua maior parte. O que não está provado está fortemente indiciado. Tal como no caso Edílson, nada há nas conversas que indique a manipulação de resultados de jogos por dirigentes do MSI/Corinthians.
Mas, eis que de repente uma conversa telefônica do então presidente corintiano, Alberto Dualib, com a eminência parda da MSI, Renato Duprat, desperta o clamor popular. Nela, de forma tola e irresponsável para um dirigente, Dualib fala pejorativamente de seu próprio time, dizendo que foi campeão “roubado”, graças à ação do STJD que tirou 14 pontos (errado, isso não existiu), senão o Internacional teria sido o campeão de fato e de direito. Foi além, dando a entender que o Corinthians foi campeão graças à atuação (não citada de forma explícita) de Marcio R de Freitas.
Ora, o que há de concreto ou revelador em tal conversa? Nada, exceto a tolice, irresponsabilidade e pouca inteligência do dirigente corintiano, que falou como mero torcedor, reproduzindo, com raiva, o tititi de torcedores sem apoio em fato algum comprovado.
A revelação de tal conversa pela Tv Record na noite de domingo, foi o que bastou para nova onda de protestos e exigências de cassação do título de 2005 e sua outorga ao Internacional, bem como o rebaixamento do Corinthians para a segunda ou até terceira divisão. Isso, por sinal, já vinha sendo pedido, também, por conta das revelações oficiais das falcatruas financeiras. Todavia, a legislação esportiva brasileira não prevê tal crime e, portanto, não há como enquadrar o clube e condená-lo. Quanto às acusações de manipulações de resultados, apesar de todas as investigações tanto na ponta “Edílson”, como na ponta “MSI/Corinthians”, nada apareceu, nada foi constatado, nada foi descoberto. O próprio tom da conversa entre Dualib e Duprat dá conta da inexistência de tal ação. Basta ler ou ouvir a conversação e isso fica evidente, pois Dualib refere-se à ação do tribunal e à arbitragem do jogo contra o Inter como coisas de fora, acontecimentos fortuitos que só permitiram, ou facilitaram, a conquista do título.
A opinião pública, claramente influenciada por paixões clubísticas e pela ojeriza e desconfiança brasileiras em relação às autoridades, fez seu próprio julgamento e, mesmo sem provas, apenas baseada no “achômetro” e em aparências, julgou e condenou o Campeonato Brasileiro de 2005.
Isso ainda vai longe.
2005 ainda não terminou.
O editor desse blog considera que o Corinthians foi o Campeão Brasileiro de 2005.
Considera, também, que 2005 terminou, esportivamente falando, no dia 4 de dezembro de 2005 para os times brasileiros.
Exceto para o São Paulo, que duas semanas depois conquistou o título de Campeão Mundial, em Yokohama, derrotando o Liverpool por 1x0.
Enfim, para esse blog, 2005 acabou.
Descanse em paz.
Post Scriptum:
Para maiores informações, recomendo o blog do Rizek e o do Juca, ambos com posts muito esclarecedores, principalmente o do Rizek.
.Marcadores: BR e Futebol Tupiniquim