Um Olhar Crônico Esportivo

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terça-feira, julho 17, 2007

Mostrou o futebol como é que é...


Na Copa de 58 ainda não tinha 4 anos. Tenho vagas recordações, nada aproveitável. Mas em 62 eu já tinha 7 anos, recém-chegado de vez a São Paulo, para morar com meus pais, deixando para trás a fazenda. Lembro das transmissões dos jogos, lembro dos balões, lembro do clima de felicidade e lembro, e melhor, tenho até hoje a trilha sonora daqueles dias na minha cabeça:

“A taça do mundo é nossa,

Com brasileiro, não há quem possa,

Eeeeeta, Esquadrão de Ouro,

É bom no samba, é bom no couro.

O brasileiro lá no estrangeiro,

Mostrou o futebol como é que é,

Ganhou a taça do mundo,

Sambando com a bola no pé!

Gooooooollllllllllllllllllllllllll!”

Sofri com o fracasso de 66, depois sofri com as indefinições e o vai-e-vem chato de Saldanha - que tentou barrar Pelé - e Zagallo - que não aceitava Pelé e Tostão e Rivelino juntos -, até definir o time que, aleluia, seguindo a velha vox populi reuniu Pelé, Tostão, Rivelino, Gerson, Jairzinho e veio a tornar-se o maior esquadrão da história do futebol, isso na opinião isenta de europeus e povos de outros continentes.

Em 74 voltou a soberba, a arrogância, e com ela o fracasso.

Em 78, depois de nova safra de indecisões, Cláudio Coutinho – com ele começou a era dos treinadores biônicos, crias da CBF do clã Havelange – ouviu a voz das ruas, a vox populi novamente, ampliada pela imprensa, e o Brasil foi com um belo time para a Argentina dirigida, comandada por um bando de assassinos, verdadeiros psicopatas, que criaram um clima de guerra para a Copa do Mundo. Uma falha da FIFA. Deu no que deu.

E, finalmente, veio 1982 e um novo time que era a digna sucessão dos esquadrões de 58, 62 e 70.

Os deuses dos estádios não quiseram que fôssemos campeões.

Assim é a vida, entramos para a história vencidos, mas com a dignidade e o reconhecimento que só os grandes vencedores têm.

E depois, bom, depois veio um deserto.

Mudou o Brasil, mudou o povo brasileiro, mudou a sociedade brasileira, assim como mudou o mundo.

Dignidade, honra, reconhecimento, generosidade, encantamento... Antigos e nobres conceitos tornaram-se apenas vocábulos de outros tempos, fora de moda, em desacordo com os dias que correm.

O próprio conceito de nobreza foi perdido. Um pouco do que resta dele, e da generosidade no campo esportivo, foi substituído pelo moderno fair play. E mesmo esse, apesar de moderno e tudo o mais, corre o risco de ser tomado como ultrapassado e brega. Como esse texto, com certeza, recheado de velharias do século passado.

Transformaram nosso futebol em apenas mais um departamento de vendas de uma grande corporação. Importa vencer a todo e qualquer custo e aumentar as vendas. O resto é irrelevante.

As massas, em sua maioria, hoje, nascidas e criadas nesse ambiente, gostam e querem mais. Um bom indicativo da mentalidade reinante é que, nos lugares mais desenvolvidos e em linha com os novos tempos, já não se vai ao estádio e sim à arena. Bom, arena para mim sempre foi o espaço no qual os cristãos eram jogados para serem devorados pelos leões e onde, depois do almoço felino, gladiadores enfrentavam-se até a morte, para gáudio da platéia ensandecida. Em toda a minha vida nunca pus meus pés numa arena, sempre em estádios e “campos”, pois era mais fácil e claro dizer que ia pro “campo” do que pro estádio.

Estou triste porque preciso desligar a trilha sonora que embalou toda minha vida.

Mas ganhamos!

Sim, ganhamos, e é isso que importa, né?

Porém... Não mais mostramos o futebol como é que é.

Estamos, simplesmente, iguais aos outros, somos mais um na multidão, perdemos nosso diferencial, estamos sufocando nossa magia, estamos tirando das pessoas o encantamento ao qual, afinal, temos direito como humanos que somos.

Será que estamos nos desumanizando?

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8 Comments:

  • At 9:52 AM, Blogger Iara Alencar said…

    Há anos que estamos nos desumanizando, so agora é visível no futebol caríssimo:
    1º quando a seleção faz bonito joga futebol e perde, é duramente criticada porque perdeu, porque o treinador nao conseguiu montar um time.
    2º quando o time não dá show, mas faz a lição de casa, é criticada porque fez feio.
    Então?

     
  • At 9:58 AM, Blogger Chico da Kombi said…

    Este comentário foi removido pelo autor.

     
  • At 10:02 AM, Blogger Chico da Kombi said…

    Parabéns pelo texto chique! :)
    No fatídico Itália 3x2 Brasil em 1982, eu tinha 21 anos e foi a única vez que chorei assistindo futebol.

     
  • At 10:17 AM, Blogger Pédre Cóshta said…

    A selecção brasileira e o futebol brasileiro são admirados pelo mundo todo pela sua espectacularidade, por aquele toque de bola especial, por aquela finta inesperada, por aquela jogada fantástica, que mais nenhuma selecção consegue fazer.
    A camisa da selecção brasileira foi vestida por pelé, garrincha, tostão, gerson, jairzinho, carlos alberto, didi, zico, sócrates, cerezo, falcão, rivellino, etc, etc, etc.
    Por isto tudo, mete respeito a todos os adversários.
    É por isso que eu, (e penso que toda a gente) quando oiço falar em selecção brasileira, a associo imediatamente a espectáculo, a um jogo que tenho de ver.
    Com a nomeação de Dunga e com a imposição do seu não futebol (e não tem a ver com a táctica, mas sim com a mentalidade por ele imposta), deixei de ver a selecção brasileira e futebol brasileiro como sinónimos e passei a ver como antónimos.
    A partir do momento em que o futebol brasileiro é posto de parte, acaba a selecção brasileira e esta passa a ser igual às outras.
    Isso, infelizmente, é o que está a acontecer. A selecção brasileira fez (se não me engano) 36 (!!!!!) faltas e viu cartões amarelos por demorar na reposição de bola em jogo, na final da copa América.
    Alguém que salve a selecção brasileira, aquela que eu sempre admirei e quis ver jogar.
    Abraces!

     
  • At 10:21 AM, Blogger Emerson said…

    Choramos, todos, Chico, e, sem querer ser piegas, esse choro nos fez muito bem como seres humanos.

    Iara, não lembro da seleção jogar bonito, perder e ser criticada. Perder é parte do esporte. Perder jogando bonito, tentando a vitória, se esforçando, é digno de elogios e não de críticas.

    E, claro, jogar bonito não é fazer firulas, embaixadinhas e coisas do tipo. É, simplesmente, jogar futebol como sempre jogamos e como a rapaziada joga nos rachões de sábado antes dos jogos de domingo.

     
  • At 10:29 AM, Blogger Emerson said…

    Pois é, Pedro.

    Eu respeito profundamente e até admiro a escola italiana, o jeito italiano de jogar futebol, e acho que ele é extremamente válido.
    Para os italianos.

    No caso do Brasil, é como você falou. Não digo que devemos jogar pelo espetáculo, mas devemos jogar de um jeito que nos consagrou e que, por decorrência, permite em muitos jogos o espetáculo, permite a jogada genial, surpreendente, inesperada.

    Abraces.

    :o)

     
  • At 5:21 PM, Anonymous Anônimo said…

    Oi Émerson, a primeira Copa que registro em minha memória é a de 70. Não sei se pela idade ou pelo fato de estar em jogo um tricampeonato e a “posse” da taça. As anteriores, só conheço através de registros alheios. Mas lembro também, que a seleção não vinha inconteste. Havia muita desconfiança. Guardo na memória, reativada pela leitura, que muito desta desconfiança originou-se na péssima campanha de 66. A seleção de 66 não quis abrir mão de bons mas veteranos jogadores de copas passadas, assim como politicamente quis agradar o Brasil inteiro. Já a seleção de 70, possuía outro espírito. Comandada por Zagallo (também uma opção de fundo político), que havia abandonado o campo como jogador a menos de 3 anos quando assumiu a seleção pela primeira vez. Também teve seus percalços, já que foi dirigida nas eliminatórias por Saldanha, mas definitivamente tinha outro espírito. Este trecho, é de uma reportagem da revista Veja, pouco antes da Copa de 70:
    “Este time, que está ganhando as eliminatórias para ir ao México em 1970, pode não ser perfeito. Mas é um time que traz uma nova mentalidade para o futebol brasileiro. Nele não há lugar para estrelas ou vedetes: Pelé, o transcendental Pelé, aceita deliberadamente uma função tática quase incompatível com as suas glórias, em favor do conjunto, da vitória.
    No momento em que Pelé dá exemplos desse tipo, o mínimo que se pode esperar dos outros jogadores é que sejam capazes de fazer o mesmo.”
    Por toda a história da nossa seleção, é que acredito que nada é eterno. Sempre haverá bons e maus momentos, mas algumas vezes são necessárias "medidas emergenciais", ou "transitórias".Mas não desanime, nada é definitivo, rsrsrsrs.
    E sabe, eu também gosto de um futebol bem jogado. E se for eficiente...bah tchê, melhor ainda.
    Abraços

     
  • At 4:08 AM, Blogger cjb said…

    Nada disso.

    Viramos Itália.

    E viva il catenaccio.

     

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